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Remix de Billie Eilish com funk cresce nas paradas do Brasil em versão 'roubada', diz produtor

Ao g1, DJ e produtor carioca Mulú diz ter descoberto 'esquema' para lucrar com o remix criado por ele. MTG (abreviação de 'montagem') é prática comum no fu...

Remix de Billie Eilish com funk cresce nas paradas do Brasil em versão 'roubada', diz produtor
Remix de Billie Eilish com funk cresce nas paradas do Brasil em versão 'roubada', diz produtor (Foto: Reprodução)

Ao g1, DJ e produtor carioca Mulú diz ter descoberto 'esquema' para lucrar com o remix criado por ele. MTG (abreviação de 'montagem') é prática comum no funk com 'colagem' de sons. Billie Eilish em foto de divulgação do álbum 'Hit me Hard and Soft' Divulgação/Estúdio Petros Se você entrou em alguma rede social ultimamente, deve ter ouvido “MTG Chihiro”, do DJ e produtor carioca Mulú. A música não foi lançada nas plataformas de streaming, mas tomou conta das redes sociais. E, com o sucesso, Mulú teve problemas. Ao g1, o produtor disse que acredita ter descoberto um “esquema” para lucrar com a sua música. A estratégia enxerga brechas nos processos de lançamentos musicais e angaria plays com faixas de outros autores. Entenda abaixo. Entenda o que é MTG, sigla que está no nome das músicas mais ouvidas do Brasil 'Cover' evita derrubada da plataforma “MTG Chihiro” é uma versão de “Chihiro”, de Billie Eilish. A música é um tipo de MTG (abreviação para “montagem”), uma prática comum no funk que implica em uma “colagem” de sons ou músicas, com novas batidas e efeitos sonoros. O QUE É MTG? Entenda o que é a sigla Com mais de 1,5 milhão de reproduções no trecho original do TikTok e 2 milhões no YouTube, “MTG Chihiro" se tornou o áudio mais usado no Instagram no Brasil. Mas isso não rendeu lucro para o produtor. Para isso, Mulú precisaria lançar a faixa oficialmente nas plataformas, o que depende da autorização dos envolvidos na música original. Enquanto tentava por vias oficiais, Mulú revelou ao g1 que foi procurado pelo vice-presidente de uma empresa americana, dona de um grande canal de versões musicais no YouTube. “Ele entrou em contato comigo oferecendo a possibilidade de lançar oficialmente a ‘MTG Chihiro’ como um cover. Basicamente, isso envolvia regravar qualquer conteúdo original da Billie Eilish, principalmente a voz, e lançar nas plataformas”, conta o produtor. Segundo o produtor, a empresa tentou convencê-lo de que, ao regravar os elementos originais, ele conseguiria driblar a fiscalização das plataformas e disponibilizar a MTG. No entanto, Mulú negou a oferta. “Meu interesse era licenciar o remix oficialmente e estava aguardando um posicionamento da gravadora sobre o meu pedido de autorização." Gustavo Deppe, advogado na área de direito autoral musical, diz que o cover sem autorização dos compositores ainda é uma violação pela lei brasileira. "A lógica é de que se comprove liberação para praticamente qualquer uso da obra, de forma prévia e expressa." O produtor Mulú é quem assina "MTG Chihiro". Reprodução/Glaucia Mayer Apesar de ser ilegal, a prática acontece muito. Com os vocais e instrumentais regravados, a plataforma tem mais dificuldade em perceber que a música foi "roubada". “A pessoa mal intencionada pode, tomando cuidado para dificultar sua identificação, fazer o upload da faixa roubada e ela continuar no ar”, conta. Versão ‘falsificada’ aparece no Spotify Mulú não quis seguir a rota do cover, mas outra pessoa seguiu. Na mesma data em que recebeu a proposta da empresa americana, Mulú encontrou uma música igual à sua, assinada por outro produtor. É a “MTG Chihiro (Funk)”, disponível em um perfil chamado Lewis Hanton. Originalmente, a versão de Hanton era integralmente igual à de Mulú em todas as plataformas. O brasileiro acredita que essa estratégia foi usada para angariar plays no perfil de Hanton, enquanto outra versão era produzida. Agora, no Spotify, a música foi substituída por um "cover". A faixa segue com a mesma estrutura, melodia e harmonia de "MTG Chihiro", de Mulú. A diferença é que os vocais e instrumentais de Billie foram regravados. Essa estratégia evita a derrubada da música no streaming. Agora, “MTG Chihiro (Funk)”, por Lewis Hanton, ultrapassa a marca de 2 milhões de plays e já está entre as 50 mais ouvidas do Spotify no Brasil. Mas quem é Lewis Hanton? No Instagram, ele se define como um “grande produtor musical”, com 216 seguidores e nenhuma publicação. No Spotify, são mais de 2 milhões de ouvintes mensais. Perfil do produtor Lewis Hanton no Spotify. Reprodução Não foram encontradas outras redes sociais ou imagens do artista. Em sua página do Spotify, somente “covers” e versões estão disponíveis. Nos créditos, consta o nome de um canal do YouTube, especializado em vídeos com letras de músicas famosas. Segundo Mulú, Hanton utilizou uma distribuidora chamada Create Music Group, que trabalha com o canal americano que o contatou. As distribuidoras, ou agregadoras, conectam artistas ao streaming, possibilitando lançamento de novas músicas na plataforma. Nesse processo, elas podem fazer (ou não) uma verificação, para avaliar se a faixa segue requisitos legais. Além disso, a página de Hanton tem o selo “verificado” do Spotify. Esse é um processo que é facilitado por distribuidoras. Procurados pelo g1, Spotify, Hanton e Create Music Group não responderam até a última atualização deste texto. Deppe acredita que a falta de verificação por parte das agregadoras pode ser um problema. “Recentemente, aqui no Brasil, houve o caso das guias do sertanejo que foram apropriadas por pessoas mal-intencionadas e chegaram até o Spotify, graças a agregadoras inacessíveis que têm um processo péssimo de verificação." Esquema profissional? Mulú alerta que, em casos como o dele, DJs e produtores podem ser especialmente afetados. “Creio que estamos diante de um esquema profissional que se aproveita de conteúdos virais nas redes sociais para lucrar de maneira ilegal”. É comum que produtores criem novas versões de faixas já existentes. Muitos remixes são feitos por “diversão” e publicados na internet, sem a intenção de ganhar dinheiro. Mas quando uma música está nas redes sociais, ela pode ser livremente acessada por qualquer um. E portanto, pode ser “roubada” por qualquer um. A melhor saída é conseguir a liberação dos autores da música original. Gustavo Deppe conta que, com isso, o produtor pode contestar os usos ilegais de sua faixa. Basta provar que o seu remix foi publicado antes do lançamento da versão “falsa”. Initial plugin text Mas ele acredita que, se o produtor não consegue a autorização, tudo fica mais difícil de contestar. “Há distribuidoras musicais por todo o mundo. Muitas delas são extremamente difíceis de alcançar, a não ser que você seja uma grande gravadora”, diz Deppe. “São milhares e milhares de faixas distribuídas nas agregadoras diariamente, tornando quase impossível a verificação correta das liberações necessárias para gravação e distribuição de fonogramas.” O advogado reforça que o mais importante é que o produtor guarde provas de que procurou todos os responsáveis (distribuidora, streaming, e, se possível, até quem “roubou” a música). Se tiver respostas (ou não), pode avaliar se buscará medidas judiciais. O produtor também pode guardar direitos sobre o remix. Foi o que Mulú fez. O produtor registrou sua parte autoral da MTG, ou seja, todos os sons que acrescentou à faixa de Billie. "É mais uma forma de se precaver", diz Deppe. O advogado explica que, como a versão de Mulú tem elementos únicos e originais, é suficiente para ser considerada uma “criação diferente” da música de Billie Eilish. ”Se alguém se utilizar desses elementos que ele acrescentou em ‘Chihiro’ de forma separada e incluí-los em algum outro fonograma, desde já o Mulú poderá ir atrás de seus direitos”, completa. Com todo o sucesso e sem a liberação de Billie Eilish e equipe, “MTG Chihiro” era um alvo perfeito. A versão de Mulú pode ter sucesso global, unindo uma música de uma grande artista internacional a uma batida contagiante. Billie Eilish na cerimônia dos Oscars 2024 REUTERS/Mike Blake Como a faixa original foi regravada, o nome mais correto para a versão de Hanton seria “Billie Eilish - Chihiro (Cover)”. Mas o produtor não usa a palavra “cover” e sim “MTG”. Para o brasileiro, essa é uma forma de se aproveitar do alto volume de buscas para a sigla. Na ausência da versão oficial, a música de Hanton pode “capturar” ouvintes desavisados, que procuram pela MTG de Mulú no Spotify. Até nas redes sociais, a versão ilegal ganha prioridade. “Quando se trata de uma música distribuída oficialmente, fica muito fácil de encontrar pela busca”, diz Mulú. Para Deppe, o caso também pode atrapalhar a imagem de Mulú. "Nem todos vão saber que não partiu dele essa atitude, o que pode prejudicá-lo agora ou no futuro. Na minha visão, isso caracteriza uma lesão à sua imagem e que deve ser indenizada" Desiludido, Mulú pretende formalizar o pedido de derrubada da música de Hanton. Ele deixa uma recomendação a outros DJs: “Tentem fazer obras mais fáceis de aprovar... Ainda estou meio baqueado pela sensação horrível de ser roubado”.